Eu também acho que o sucesso de Coringa não tem muita relação com Batman

Laura
3 min readJan 3, 2020

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Recentemente, deu, pelo menos no Omelete (e provavelmente em muitos outros portais), a seguinte afirmação de Todd Phillips, diretor do filme Coringa:

Acredito que seja mais do que isso. Quer dizer, existem alguns temas no filme que realmente mexeram com as pessoas. […] Quando fomos escrevê-lo, eu e Scott Silver queríamos criar algo significativo no espaço dos quadrinhos, mas também algo que tratasse do que acontecia em 2016, quando começamos a trabalhar no roteiro. É bastante óbvio o que estava acontecendo no nosso país em 2017 enquanto escrevíamos e queria realmente usar o Coringa para falar sobre a falta de compaixão e decoro no mundo.”

Como esperado de qualquer notícia viralizada como “Diretor de Coringa acredita que sucesso de filme não tem relação com Batman”, a afirmação deu o que falar. Entre réplicas de que o filme jamais teria o mesmo alcance se não fosse do universo de Batman e deboches citando Bozo ou qualquer outro palhaço popular, ninguém parece ter lido a afirmação do diretor.

Todd Phillips nunca negou que o filme nasceu de um vilão de renome dentro do mundo dos quadrinhos. Também nunca disse que ser um filme da franquia Batman não é um grande facilitador de bilheteria, interesse de público e tudo mais. Ele disse, e isso fica claro na primeira frase da citação feita pela matéria original, que o sucesso do filme é mais do que isso.

É possível fazer um filme do Coringa que é fracasso de bilheteria, de público, de crítica. Todd acredita que o sucesso de seu filme não é simplesmente por ser um filme do Coringa, e sim por ser um filme que conversa com a audiência. Aliás, eu não entendo nada de quadrinho de herois mas já cansei de ler fã reclamando desse Coringa por vários motivos, a maioria dos quais não lembro porque, sinceramente, pouco me importam.

Segundo o diretor do filme, o que acontecia nos EUA em 2016 e 2017 foi importante na hora de escrever o roteiro (eleição e primeiro ano de mandato do Trump provavelmente são eventos importantes). O filme queria se aproximar da realidade das pessoas de hoje, mesmo se passando tecnicamente há umas boas décadas atrás. E esse é, provavelmente, um grande fator do sucesso do filme. O público aparentemente gostou da crítica feita, do novo olhar para o personagem, porque o filme fala de coisas atuais.

Na minha visão, como formada em Psicologia, a discussão ali proposta sobre sociedade, condição neurológica e doença mental é realmente um dos pontos mais fortes do filme, o que me fez inclusive ir ao cinema assistir (quem me conhece sabe, eu quase não assisto filme de heroi). Não é, obviamente, o primeiro filme a criticar desigualdades sociais e provavelmente não teria o mesmo alcance se não fosse um filme de Batman. Mas eu não acho que o diretor está errado ao dizer que o sucesso dele vai além disso.

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